Desvinculação do HU é questionada e rechaçada em debate na Faculdade de Medicina da USP, em 25/8

Fotos: Daniel Garcia

Aspecto do debate após saída dos professores Auler Jr. e Sandra Grisi, que tinham reunião no HC
Aspecto do debate após saída dos professores Auler Jr. e Sandra Grisi, que tinham reunião no HC
 
O “pacote” de medidas drásticas propostas pela Reitoria para, supostamente, contornar a chamada crise financeira da USP, as quais incluem a “demissão voluntária” de 3 mil funcionários técnico-administrativos e a desvinculação do Hospital Universitário (HU) e do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais de Bauru (HRAC), que passariam à órbita da Secretaria Estadual da Saúde, vem provocando inédita mobilização de crescentes parcelas da comunidade universitária, no sentido de evitar o irresponsável desmanche da universidade.

Depois do debate que lotou o auditório Abrahão de Moraes do Instituto de Física (IF) em 22/8, que teve expressiva repercussão em outras unidades, e de uma plenária de médicos no HU no mesmo dia, quando se ouviu um forte coro de “Fora Zago!”, nesta segunda-feira 25/8, pela manhã, foi a vez de a Faculdade de Medicina (FMUSP) realizar um importante debate sobre o assunto, com ênfase para a questão do HU. A iniciativa foi do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz (CAOC), que na semana passada já emitira nota a respeito.
Participaram da mesa Murilo Germano, presidente do CAOC; o professor José Otávio Costa Auler Jr., vice-diretor da FMUSP; a professora Sandra Grisi, do Conselho Superior do HU; Gerson Salvador, diretor do Sindicato dos Médicos e médico do HU; e o professor Ciro Correia, presidente da Adusp. “A ideia inicial dessa mesa é fazer um panorama razoavelmente breve, mas que seja completo, do que a gente vem vivendo nesses últimos dias, desde a notícia que saiu na mídia da possível transferência dos hospitais”, resumiu Germano na apresentação.
O reitor Marco Antonio Zago, convidado a falar com exclusividade na mesa seguinte, das 10h30, no mesmo ciclo de debates, não compareceu. Em função da sua ausência, os organizadores decidiram expandir o horário da primeira mesa.

“HU é uma plataforma de ensino”

 Exposição do professor José Otávio Auler Jr., vice-diretor da FMUSP

Exposição do professor José Otávio Auler Jr., vice-diretor da FMUSP

O vice-diretor da FMUSP iniciou sua exposição citando “a admiração e orgulho de pertencer” à USP, “quer seja como docentes, quer como funcionários, quer como alunos”. Em seguida, destacou o papel dos estudantes no presente momento de impasse: “Vocês, iniciando agora como alunos da universidade, têm um papel fundamental até no sentido do futuro da universidade, porque é um patrimônio de fato, do Brasil, do Estado de São Paulo, patrimônio de todos nós, por isso é importante esse diálogo na construção de um momento difícil, mas se nós todos nos debruçarmos e nos propusermos a dialogar de maneira tranquila, serena, com certeza vamos achar um caminho para sair dessa situação, um caminho que preserve principalmente a instituição, preserve a qualidade da Universidade de São Paulo”.

O professor Auler Jr. revelou que a preocupação com o impasse atual é tamanha, na FMUSP, que “tem tirado até o nosso sono, e para nós, além do contexto geral da USP a princípio posto — o professor Ciro tem uma apresentação bastante elucidativa sobre o assunto — nós temos uma preocupação também com o Hospital Universitário”.
Acrescentou que “com a ajuda do Centro Acadêmico, com a colaboração dos docentes, com a colaboração principalmente dos estudantes, nós estamos pensando em um novo currículo, adaptado às novas condições sociais e políticas da Medicina no país”, e que esse currículo “está muito fundamentado na estruturação das nossas plataformas de ensino, quer seja da região oeste [da capital], quer seja do Hospital das Clínicas e muito também do Hospital Universitário”.
O vice-diretor da FMUSP externou sua opinião de que o HU deve permanecer vinculado à USP: “Então nós todos entendemos que o Hospital Universitário é uma plataforma de ensino, onde existe um consórcio de escolas médicas: são seis escolas médicas com a Medicina, e onde os estudantes têm um treinamento importante, principalmente em problemas de internados”. E pediu o engajamento dos estudantes na luta para que o HU não seja desligado da USP: “Agora, o que tem acontecido, o que é nossa preocupação, é que talvez seja necessário um envolvimento maior, o que nós estamos pedindo, até por uma nota que foi anunciada na sexta-feira [22/8] pela diretoria da faculdade”.
Sandra Grisi, por sua vez, destacou que aqueles que defendem que se conceda mais tempo para uma avaliação aprofundada das propostas para o HU o fazem numa atitude de contribuição, que deveria ser acolhida ao invés de negada. Ao comentar as características peculiares do HU enquanto unidade de ensino, defendeu que “é preciso preservar e ampliar essa plataforma com a destinação dos devidos recursos”, o que não estaria ocorrendo atualmente. Concluiu dizendo que a posição da FMUSP no momento é de simplesmente pedir que o assunto seja melhor estudado, que se dê “uma pausa para a reflexão”, e que será importante o esforço de todos nesse sentido.
Gerson Salvador destacou a coragem do professor Auler Jr. ao colocar com clareza, na última reunião dos dirigentes de unidades com o reitor, a posição da FMUSP de que não se decida sobre a questão às pressas, sem o necessário tempo para a devida análise. O presidente do Sindicato dos Médicos expôs seu conhecimento das características diferenciadas do HU, dada a sua experiência como estudante da FMUSP e hoje membro do corpo clínico daquele hospital, que considera reunir condições mais adequadas para a formação de estudantes e residentes, o que o leva, portanto, a tomar posição firmemente contrária à desvinculação proposta.

“Por que reajuste zero?”


 
Presidente da Adusp apresenta seus dados, acompanhado com atenção pelo público

Após saudar os demais integrantes da mesa e agradecer o convite, o presidente da Adusp destacou a singularidade do debate na FMUSP: “Eu acho muito importante o que está acontecendo aqui, porque embora possamos ter diferentes visões sobre questões públicas, de qual deve ser a forma de gestão de uma entidade de relevância social como o hospital, principalmente o Hospital Universitário, independentemente de qualquer diferença de visão o que me parece que todos aqui estão dizendo é o seguinte: não se pode tomar uma decisão desta relevância de maneira apressada, sem o devido debate e sem a devida conclusão de que efetivamente é defensável. Fica difícil a gente entender por que é que neste momento o reitor da universidade, uma pessoa da área médica com a experiência que tem, procura fazê-lo de uma forma que está gerando uma reação justificada muito grande”.

Em seguida, Ciro fez o seguinte preâmbulo, antes de passar à sua apresentação de dados no telão (a mesma que fez no IF): “Esta proposta de desvinculação [dos hospitais universitários] está sendo apresentada pela Reitoria diante de uma alegada crise financeira que a universidade está enfrentando, então o papel que eu vou procurar desempenhar aqui é de tratar daquilo que tem sido alegado como crise, aquilo que se sustenta e aquilo que não se sustenta; quais são os eventuais caminhos para superá-la, para a gente compreender em que local desse debate mais amplo a proposta de desvinculação do HU, do HRAC e a proposta da Reitoria, que é uma imposição, de perda salarial através da não concessão de reajuste, que seria o reajuste zero — como é que essas coisas se articulam”.
Ciro destacou, na apresentação, o fato de que o Orçamento de 2014 da USP, elaborado pela Comissão de Orçamento e Patrimônio (COP) já na atual gestão, por pessoas indicadas pelo próprio reitor Zago, dispõe de uma reserva expressamente destinada a atender a política salarial definida pelo Cruesp. “Ou seja, o Conselho Universitário (Co) aprovou R$ 129 milhões para reajuste salarial. Isso daria um reajuste de 3,5% para ser pago até dezembro, ou 2,8% a ser pago até abril do ano que vem, quando tem nova data-base. Por que é que 3 virou zero? 2,8%, 3,5% é diferente de zero. Não pode! Está previsto! Isso tem que entrar na discussão, mas virou zero pela vontade ou pela determinação do reitor”.

“Insensatez a toda prova”


 
Exposição de Gerson Salvador, diretor do Sindicato dos Médicos

Depois, o presidente da Adusp abordou a questão do HU. “Vocês sabem qual é, em termos de dinheiro, a economia que a USP quer fazer com a transferência do HU para a Secretaria da Saúde?”, provocou. “O orçamento do HU está por volta de R$ 370 milhões; desses R$ 370 milhões, [cerca de] R$ 270 milhões é a folha de pagamento e R$ 50 milhões são outros gastos que a USP tem; os outros R$ 50 milhões são outros recursos”, em especial repasses do SUS. “O que o Reitor está dizendo? ‘Vou transferir o HU para a Secretaria da Saúde, mas vou manter o pessoal do HU na USP para que eles tenham garantia de seus salários e tal’. Qual é a economia que ele faz então? R$ 50 milhões de outras verbas que saem dos cofres da USP, ou seja, eu perco minha capacidade de gerir o HU, de gerir as políticas de ensino dentro do HU, economizo R$ 50 milhões e fico com uma folha que continua sob minha responsabilidade a longo prazo, de R$ 270 milhões. É de uma insensatez a toda prova”, denunciou.

“Tem que haver algo que não está explicitado nessa proposta e talvez seja isso, não poder explicitar o que está atrás, que faz com que ela tenha que ser aprovada a toque de caixa, de qualquer jeito, por que se for discutir direito talvez apareça a verdadeira razão”, sugeriu.
Após a apresentação de Ciro, foi aberto espaço para manifestações do plenário, ocasião na qual ficou clara a compreensão geral da absoluta inadequação do encaminhamento proposto pela Reitoria. Em várias falas era evidente a preocupação de que a proposta tivesse viés privatizante, no sentido de favorecer que o HU viesse a ser de fato assumido não pela Secretaria da Saúde, diante das limitações orçamentárias que enfrenta, mas por interesses privados via fundações ditas “de apoio” ou organizações sociais.
Germano, do CAOC, encerrou os trabalhos lembrando que a luta em defesa do HU estava apenas se iniciando, e conclamou todos a participarem ativamente do ato previsto para 26/8, diante do local em que viesse a se reunir o Co, que ainda não era conhecido naquele momento.
 
 
 

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!