A comunidade universitária deve lembrar-se do alarde em jornais de grande circulação que, em 2001, animou a sociedade paulista com a notícia de que, a partir de então, haveria 64 mil novas vagas na Educação Superior no Estado de São Paulo. O que os jornais não noticiaram era como esta expansão se daria: por meio de cursos seqüenciais, com certificações intermediárias, ocupando, inclusive, salas de escolas de Educação Básica que estivessem vagas, nos vários municípios, em particular no período da tarde.

Qualquer semelhança com movimentações atuais, nos níveis estadual (dobrar o número de Fatecs, quando as atuais, já “expandidas” ainda não contam com condições de funcionamento) e federal (Programa Reuni), não parece ser mera coincidência. As características comuns são evidentes: reestruturação e ampla expansão da Educação Superior pública, mas sem que lhe sejam destinados os recursos correspondentes.

A expansão é necessária, quando se tem em conta que no ano passado, no Brasil como um todo, apenas cerca de 20% dos ingressos na Educação Superior se deram em instituições públicas; e que, no Estado de São Paulo, a proporção não chega à metade destes. Entretanto, que papel a Educação Superior exerce no contexto nacional, na atualidade? Que tipo de formação o país necessita, que tipo de formação fará diferença para os ingressantes de hoje, projetando-a para sua atuação profissional daqui a 10 anos? Por que razão temos doutores desempregados, quando, na mesma cidade, aparentemente é necessário estar inscrito em uma faculdade para exercer a função de caixa de supermercado?

As respostas a tais questões, evidentemente, nos remetem à supremacia do setor privado na Educação Superior e de seus interesses imediatistas que não têm paralelo no resto do mundo quanto a sua abrangência.

Acenos do Reuni

O que o país de fato precisa, e a que seus jovens têm direito, são vagas em instituições públicas que primem pela qualidade da Educação Superior. Os últimos movimentos de quem deveria traçar planos para garantir a efetivação deste tipo de demanda vão na direção contrária.

O Reuni, instituído pelo Decreto Federal nº 6.096/07, complementado pelas “Diretrizes” elaboradas por um comitê de 13 acadêmicos em agosto, acena com verbas “limitadas a 20%”, daquelas disponibilizadas no ano da adesão, para exigir a ampliação das matrículas em mais de 70% para a grande maioria das 54 universidades federais, ao cabo de cinco anos. Analisando-se o Decreto, verifica-se que estes parcos recursos não estão garantidos, pois, tratando-se de promessa em valores nominais, a ser resgatada após cinco anos, tal montante pode, simplesmente, ser “comido” pela inflação.

Algumas universidades mais antigas, com pós-graduação, em nível de doutorado, com conceitos Capes elevados, poderão apresentar índices inferiores a 60% de expansão. Elas situam-se nas regiões sul e sudeste e foram selecionadas como “centros de excelência”. Mesmo universidades tradicionais em pesquisa, como as de Santa Maria, a Federal Fluminense e todas as das regiões Nordeste e Norte, não foram contempladas por um “desconto”. Este “desconto” foi construído pela comissão das “Diretrizes” como uma redução no número de professores exigidos por uma das metas e foi limitado a 5% para quase todas as universidades.

Metas inatingíveis

O Reuni pretende atingir expansões impondo às universidades federais 2 metas incompatíveis com a qualidade da educação, pautada pelo tripé ensino-pesquisa-extensão. Como mostram comparações internacionais, não sobrará outra opção, àquelas universidades não selecionadas como “centros de excelência”, a não ser concentrarem-se fortemente nas atividades de ensino de graduação, deixando a pesquisa e a extensão de lado. De fato, lembrando que a razão estudante de graduação por professor na USP está entre 8 e 9, como atingir a meta do Reuni, de 18/1, sem superlotar as classes? Se a taxa média de conclusão de cursos de graduação encontra-se, internacionalmente, no patamar de 70%, (e a USP está abaixo disto, assim como as universidades federais), como atingir a fantástica meta do Reuni de 90%? Com classes cheias e tal propósito, teremos transplantado para as universidades públicas o fenômeno da aprovação automática? As “outras” universidades federais tornar-se-ão mais parecidas com o setor privado, facilitando a atuação deste?

O que leva os reitores de algumas universidades federais e os correspondentes Conselhos Universitários a se submeterem a tais exigências? Será a imensa restrição no financiamento a que estão submetidos e talvez a vaga esperança de que “se dará um jeitinho brasileiro” no fim?

 

Matéria publicada no Informativo n° 247

EXPRESSO ADUSP


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