Chapa desistente elege nova diretoria do IRI em processo eleitoral avaliado como ilegítimo

Cinco dias após renunciar à disputa eleitoral, a professora Janina Onuki foi eleita diretora do Instituto de Relações Internacionais (IRI). Esta situação inusitada na menor unidade da USP é o resultado de um processo eleitoral conturbado, que a própria Comissão Eleitoral tentou corrigir, que é contestado amplamente na comunidade e até nas instâncias diretivas (Direção e Congregação) e que foi judicializado.

IRI/USP
Professor Amâncio de Oliveira 

O processo eleitoral teve início em 6/9, com prazo para inscrição de chapas entre os dias 6/10 e 16/10 e primeiro turno marcado para 22/11. Segundo o Estatuto da USP, são previstas duas etapas para as inscrições de chapas. Uma primeira etapa é aberta para professores titulares e professores associados de nível 3. Caso não se inscrevam pelo menos duas chapas, uma segunda etapa é aberta, tornando possível a inscrição de chapas formadas por professores das demais categorias. Criado há poucos anos, o IRI conta com apenas 16 docentes, dos quais somente três professores titulares: o atual diretor, Pedro Bohomoletz de Abreu Dallari, o atual vice-diretor, Amâncio Jorge Nunes de Oliveira, e a professora Janina Onuki.

No dia 15/10, quatro professores associados de nível 1 do IRI tornaram pública, por meio do Facebook, sua intenção de disputar as eleições por meio da chapa “Por um IRI Multidisciplinar”, esperando que a segunda etapa de inscrições fosse aberta. A chapa seria encabeçada pela professora Maria Antonieta Del Tedesco Lins, tendo o professor Felipe Pereira Loureiro como vice.

Kathrin Zeller/Fundação Konrad Adenauer
Professora Maria Antonieta

No entanto, no dia 17/10 foi revelado que duas chapas haviam se inscrito na primeira etapa: uma encabeçada pelo vice-diretor Amâncio de Oliveira, e outra por Janina Onuki. Esta última apresentava como candidato a vice-diretor um professor titular de outra unidade, Moacyr Martucci Junior, da Escola Politécnica (EP), expediente que é formalmente permitido, mas foi imediatamente percebido como manobra ilegítima, imaginada com a finalidade de impedir a realização da segunda etapa — e assim barrar a apresentação da chapa “Por um IRI Multidisciplinar”.

Pesava contra as duas chapas inscritas a suspeita de engodo, uma vez que apenas Amâncio de Oliveira tinha interesse nítido em galgar a Direção da unidade, diferentemente de Janina Onuki. Ademais, a identidade programática de ambas era total, como observou o Centro Acadêmico Guimarães Rosa (Guima): “Não há real distinção entre as duas chapas de titulares inscritas na eleições”. A inscrição separada, que só foi possível com a entrada de um docente da EP para completar a chapa liderada por Janina Onuki, tiraria a chapa “Por um IRI Multidisciplinar” da disputa eleitoral, ao inviabilizar a segunda etapa.

Em 18/10, o Guima publicou nota que acusava o processo eleitoral de ser “um golpe institucional que visa impedir a real disputa de ideias e de projetos para o IRI”. Após tentativas fracassadas de diálogo com as duas chapas, em 7/11 os estudantes decretaram greve “até que haja a desinscrição temporária de uma ou de ambas as chapas atualmente inscritas”.

Terceira chapa e novo prazo

DCP/USUP
Professora Janina Onuki

Dez dias depois, a Comissão Eleitoral, presidida pelo professor Kai Enno Lehmann, decidiu admitir a inscrição da chapa “Por um IRI Multidisciplinar” e sugeriu ao diretor Pedro Dallari a abertura de um novo prazo para as eleições. Em 21/11, o diretor assinou uma portaria que postergou o primeiro turno da eleição para 11/12. No dia 24/11, a Congregação do IRI reuniu-se em sessão extraordinária para tratar do tema, e aprovou a decisão da Comissão Eleitoral por sete votos, com três votos contrários e duas abstenções.

Entretanto, em 28/11 o vice-diretor Amâncio de Oliveira impetrou um mandado de segurança contra o diretor do IRI, buscando restaurar o processo eleitoral com apenas duas chapas. O mandado foi indeferido no dia 4/12 pelo juíz Olavo Zampol Júnior, da 10ª Vara de Fazenda Pública (TJ-SP), que não viu irregularidades na decisão da Comissão Eleitoral, depois referendada pela Congregação.

No dia 6/12, véspera da consulta eletrônica à comunidade, a chapa da professora Janina Onuki renunciou à disputa. Assim, a consulta de 7/12 envolveu as duas chapas restantes: a do professor Amâncio de Oliveira e a da professora Maria Antonieta Lins. O resultado foi uma ampla vitória da chapa “Por um IRI Multidisciplinar” em todos os segmentos: 184 votos contra 21 entre os estudantes, 19 a 8 entre os funcionários e 17 a 8 entre os docentes.

Na mesma data da consulta, porém, um agravo de instrumento interposto pelo vice-diretor foi aceito pelo desembargador Rubens Rihl, da 1ª Câmara de Direito Público do TJ-SP. Ele determinou que a inscrição da chapa “Por um IRI Multidisciplinar” fosse desconsiderada, restaurando o processo eleitoral nas suas condições iniciais.

Desse modo, contrariando a Comissão Eleitoral, a Direção e a Congregação do IRI, a eleição indireta para diretor(a) e vice-diretor foi realizada no dia 11/12 entre as chapas de Janina Onuki e Amâncio Nunes de Oliveira. O resultado foi a vitória da chapa desistente, por 25 votos contra 11 e dois nulos, indicando assim, paradoxalmente, forte rejeição do colégio eleitoral às pretensões de Amâncio de Oliveira.

“Iniciativa muito infeliz”

O futuro da gestão de Janina Onuki ainda não está claro, mas as críticas a ela e ao professor Nunes de Oliveira persistem. “A contestação judicial da decisão da Congregação pelos professores Amâncio de Oliveira e Rafael Villa foi uma iniciativa muito infeliz daqueles colegas, que prejudicou a continuidade das atividades do IRI, indiscutivelmente um dos projetos atuais mais interessantes e inovadores da USP”, declarou o diretor Pedro Dallari ao Informativo Adusp.

“A chapa integrada pela professora do IRI Janina Onuki e pelo professor da Engenharia Elétrica da Poli Moacyr Martucci chegou a desistir formalmente da disputa, não participou da consulta à comunidade do IRI e acabou prevalecendo exclusivamente por conta da intervenção judicial que impediu a chapa da professora M. Antonieta de concorrer”, acrescentou Dallari. “A falta de representatividade da chapa que prevaleceu é evidente e a legitimidade do processo só será alcançada com a realização de eleição que permita à comunidade do IRI escolher livremente entre as alternativas existentes”.

Na última reunião do Conselho Universitário (Co), em 12/12, a representante discente Mariana Ribeiro expôs a situação do IRI com duras críticas ao vice-diretor e aos seus aliados. “O IRI se encontra sequestrado na mão de um grupo minoritário, isolado e autoritário, que não se importa se o instituto cair aos pedaços desde que estejam na diretoria”, cravou a estudante. “Os professores Amâncio e Rafael Vila, Janina e Moacyr são verdadeiras personas non gratas no instituto e mesmo assim acham que têm alguma legitimidade e respeito para continuar a dirigí-lo”, prosseguiu, para concluir: “As atitudes deles ferem a autonomia universitária e qualquer princípio de ética. Eles não deveriam sequer ser professores desta universidade e o que dirá diretores. Enquanto o instituto não for devolvido à sua comunidade e a democracia e a ética não forem restauradas, o IRI será ingovernável”.

Presente à reunião do Co, o professor Amâncio de Oliveira pediu direito de resposta. Ele questionou os motivos pelos quais a professora Janina Onuki foi acusada de inscrever uma chapa “fantasma”: “A professora Janina não pode ter autonomia para concorrer a um cargo de dirigente?”. Destacou a “seriedade da professora Janina” e considerou “uma vergonha” a crítica feita pela representante discente. “Entendo a frustração dos professores associados, mas essa é a regra da Universidade, ela foi preservada neste momento”, declarou o vice-diretor do instituto, referindo-se à decisão do desembargador Rubens Rihl de descartar a chapa “Por um IRI Multidisciplinar”.

Ele pediu apoio ao Co. “Mais do que tudo peço apoio para a professora Janina, que é uma pessoa séria e venceu as eleições. Espero que ela tenha apoio para que governe e pacifique o IRI”, encerrou, repudiando ainda o que chamou de “ameaça de greve”.

Procurados para comentar o caso, a diretora eleita Janina Onuki, os professores Kai Lehmann e Amâncio de Oliveira e a professora Maria Antonieta Lins não responderam ao Informativo Adusp até o fechamento desta matéria.

EXPRESSO ADUSP


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