No processo de Avaliação para Progressão de Nível na Carreira Docente, algumas comissões setoriais (CAS) comportam-se de maneira imperial, atropelando o espírito e a letra da Resolução 5.927/2011. Esta norma reformou a carreira ao segmentar o cargo de Professor Doutor em níveis 1 e 2 e a função de Professor Associado em níveis 1, 2 e 3; e ao instituir a progressão horizontal entre esses níveis. Diferentemente dos concursos (para Professor Titular, por exemplo), nos quais candidatos disputam vagas uns com os outros, a progressão horizontal baseia-se na avaliação, por pareceristas, do mérito dos candidatos conforme os memoriais por eles apresentados, sem comparações e sem competição entre pares. 

Além disso, na progressão horizontal leva-se em conta, em tese, a qualidade do conjunto de atividades desenvolvidas pelo candidato ou candidata, sabendo-se de antemão que é impossível a um docente sair-se excepcionalmente bem em todas as frentes: graduação, pós-graduação, pesquisa, extensão, engajamento institucional…

Isso é o que preconiza a Resolução 5.927. Mas não foi o que aconteceu em diversas áreas. O primeiro golpe na norma foi desferido pela própria Comissão Central de Avaliação Docente (CCAD), ao criar, no documento intitulado “Diretrizes”, a chamada “Fração Niveladora”, que supõe a fixação de um percentual máximo de aprovações por área — e a adoção de notas de corte. Diante dos protestos, a CCAD recuou e desautorizou as “Diretrizes”. Mas parte das CAS decidiu seguir em frente com a fração niveladora (vide Informativo Adusp 355 e 356). Parece ter sido esse o caso da CAS de Ciências da Terra.

Vejamos: inconformado com a decisão da CAS de preterir a sua candidatura ao nível de Professor Associado 3, o professor Ciro Correia, do Instituto de Geociências (IGc), ingressou, em 5/11/12, com um pedido de reconsideração na própria CAS. Ele apontou o “flagrante antagonismo” entre, de um lado, o parecer conclusivo da CAS, que rejeitou sua pretensão; e, de outro lado, os três pareceres dos assessores, todos favoráveis ao candidato. 

Ainda no pedido de reconsideração, o professor inclui tabela em que constam os conceitos recebidos por ele na avaliação dos assessores: três “excelente”, seis “muito bom”, quatro “bom” e apenas dois “regular”. Nenhum “insuficiente”. Segundo os critérios da própria CAS, isso resultaria na média final 3,7 (para um total de 5). Todos os pareceristas são professores titulares com atuação científica na área do candidato, reconhecidos dentro e fora do país por suas trajetórias acadêmicas.

Porém, em absoluta rota de colisão tanto com os critérios da CAS quanto com o entendimento expresso dos três pareceristas, o relator da candidatura do professor Ciro concluiu que “no conjunto … as atividades do interessado não satisfazem os critérios para a progressão na carreira” (sic)!

Em resumo: o relator nomeado pela CAS colocou-se acima da opinião unânime dos assessores designados pela própria CAS.

“Desempenho médio”?

Apresentado em 5/11/12, o pedido de reconsideração não teve sorte melhor. “Os pareceres dos assessores indicam que o Dr. Ciro foi bem avaliado nos diversos itens, com exceção da orientação de trabalhos que foi considerado regular a bom … Note-se que os avaliadores externos não têm como comparar o docente com outros no mesmo nível dentro do conjunto que pleiteia a progressão na carreira”, assinalou o parecerista da CAS (anônimo, ao contrário dos três primeiros). “A falta de orientação de alunos é um ponto crítico … A decisão final da Comissão de Avaliação da Carreira docente se baseou em critérios quantitativos considerados insuficientes para a progressão tendo em vista o universo de casos julgados pela comissão”.

Já o relator (também incógnito, diferentemente da etapa inicial) acrescentou, no parecer conclusivo da etapa de reconsideração, que a assessoria ponderou que, “embora o candidato tivesse sido muito bem avaliado pelos assessores anteriores, o seu currículo mostra falhas que não são compatíveis com o nível pretendido, principalmente quando se considera o desempenho médio demonstrado pelo universo de pesquisadores com que a CAS em Ciências da Terra trabalha”. 

Assim, a CAS decidiu, à revelia da Resolução 5.927, incluir a comparação como critério de avaliação, a tal ponto que o parecerista da etapa de reconsideração desdenhou dos avaliadores externos, uma vez que estes “não têm como comparar o docente com outros no mesmo nível dentro do conjunto que pleiteia a progressão na carreira”! Nessa mesma lógica, portanto, é que parecerista e relator citaram “o universo de casos julgados” e “o desempenho médio demonstrado pelo universo de pesquisadores com que a CAS trabalha”.

Diante da insistência da CAS em ignorar a Resolução 5.927, o professor Ciro recorreu à CCAD. “Estaria a CAS trabalhando segundo regras próprias, estranhas à Resolução 5.927?”, indaga o docente no seu recurso (http://goo.gl/oHf0D). “Estaria ainda sob a influência da malfadada e já oficialmente retratada (após os questionamentos havidos por iniciativa da Congrega­ção do Instituto de Geociências – IGc) decisão da CCAD de trabalhar com o mecanismo da Fração Niveladora”?

Apesar das exceções louváveis representadas pela atuação de algumas CAS, a verdade é que a Progressão Horizontal foi concebida e vem sendo executada com a mesma lógica de competição interna, de concorrência entre os docentes (inclusive para fins de controle da força de trabalho), introduzida no ensino superior mundial após o advento do neoliberalismo — e que, paulatinamente, vem se apossando das universidades brasileiras. Uma vez pautada a avaliação produtivista da universidade e dos que dela fazem parte, a atividade acadêmica torna-se cada vez mais alheia a qualquer análise qualitativa do seu papel, da sua função social, da primazia da reflexão crítica enquanto pressuposto de qualquer processo educacional efetivo.

Combater abusos

É importante que candidatos à progressão horizontal que tenham ingressado com pedidos de reconsideração fiquem atentos a atitudes das CAS de suas respectivas áreas, eventualmente semelhantes à relatada acima.

Obviamente, é intolerável que a norma da USP seja “atropelada” ou ignorada por aqueles que deveriam ser os primeiros a cumpri-la. Porém, mais do que isso, é crucial quebrar as rotinas segredistas operadas pela burocracia em torno da avaliação. Só o conhecimento público das incoerências e do desvirtuamento do processo em curso é que permitirá reverter as injustiças cometidas.

O Departamento Jurídico da Adusp recomenda aos docentes que desejarem apresentar pedido de reconsideração, que não deixem de imprimir cópia da página do sistema que acusa o envio do pedido. Isso porque já se tem conhecimento de dois casos em que o pedido foi enviado, mas não consta do sistema.

Apoio a docentes

Os professores associados Ciro Correia, Daniel Atêncio e Ginaldo da Cruz Campanha, que impetraram pedidos de reconsideração das preterições sofridas, receberam em 27/11/12 apoio unânime do Conselho Deliberativo do Departamento de Mineralogia e Geotectônica (GMG) do IGc. A deliberação foi encaminhada à CCAD.

Os três pleitearam progressão para Professor Associado 3, porém a CAS de Ciências da Terra, além de negar a progressão de Correia, atribuiu apenas o nível de Associado 2 para Atêncio e Campanha.

O Conselho do GMG declarou que “as trajetórias acadêmicas e características de engajamento institucional destes docentes” e “o fato de terem sido aprovados, em momentos anteriores, com desempenho destacado, em concursos públicos para cargos de Professor Titular no Departamento”, os credenciam “de modo inequívoco para a progressão ao nível solicitado”. Solicita “que as decisões sejam revistas e que os pedidos de reconsideração endereçados à CAS sejam deferidos”.

Informativo nº 357

EXPRESSO ADUSP


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